17.2.09

>> Manoel e os gêmeos.

Abaixo estão duas poesias do matogrossense manoel de barros, escritor que aprecio, principalmente por ter como temas recorrentes, a criança, o homem do campo e a natureza. O jeito como brinca com as palavras e com as idéias é instigante e divertido. Para acompanhar as poesias, coloquei as fotos que tirei das obras dos 'gêmeos'. Perdi de ver 'os gêmeos' quando estiveram em são paulo, mas por sorte vi em curitiba no museu oscar niemeyer. As outras exibições estavam ótimas também e com tempo colocarei por aqui. Quando vou a curitiba esse é um passeio que curto e faço sempre, e caramba, todas as vezes as exibições estavam incríveis! Sério, para quem gosta de museu e arte é a minha dica.

Uma didática da invenção


'VII

No descomeço era o verbo.
Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá
onde a criança diz: Eu escuto a cor dos
passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não
funciona para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um
verbo, ele delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta, que é a voz
de fazer nascimentos -
O verbo tem que pegar delírio.'

Manoel de barros . trecho do livro 'o livro das ignorãças'

.

'Tenho um livro sobre águas e meninos.
Gostei mais de um menino que carregava água na peneira.
A mãe disse que carregar água na peneira
Era o mesmo que roubar um vento e sair correndo com ele para
mostrar aos irmãos.
A mãe disse que era o mesmo que catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos
A mãe reparou que o menino gostava mais do vazio do que
do cheio.
Falava que os vazios são maiores e até infinitos.
Com o tempo aquele menino que era cismado e esquisito
Porque gostava de carregar água na peneira
Com o tempo descobriu que escrever seria o mesmo que carregar
água na peneira.
No escrever o menino viu que era capaz de ser noviça, monge
ou mendigo ao mesmo tempo.
O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de interromper o vôo de um pássaro botando
ponto final na frase.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!'

Manoel de barros . trecho do livro 'exercícios de ser criança'


fotos da exposição dos gêmeos no MON em curitiba.

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